A televisão e a
experiência performática na sala de aula
Fernando Augusto Violin
A TV Pendrive,
como ferramenta de ensino na sala de aula, permite o trabalho com o recurso de
filmes, imagens, sons e movimentos. Durante a exposição de um filme, por
exemplo, relacionado a um conteúdo sociológico, o processo de ensino cria uma performance na sala de aula que intensifica as
experiências sensoriais e sensitivas em que a imagem, o som e o movimento
destacam-se numa experiência que possibilita o deslocamento das percepções,
onde o significado possa ser produzido e percebido de maneira mais intensa.
O antropólogo Victor Turner (2005) captou a
diferença em Dilthey que ele chama entre “mera experiência” e “uma
experiência”. A “mera experiência” é a
passiva resignação e aceitação dos eventos. “Uma experiência” é “como uma pedra
num jardim de areia Zen, destaca-se da uniformidade da passagem das horas e dos
anos e forma aquilo que Dilthey chamou de uma ‘estrutura da experiência’”. Ou
seja, ela não tem um início ou um fim arbitrários,
mas tem o que Dilthey chamou de “uma iniciação e uma consumação”, esclarece
Turner (2005, p. 178-179).
Ele continua dizendo que todos nós já tivemos certas experiências ao
longo da vida que foram “formativas” e “transformativas” envolvendo sequências
distinguíveis de eventos externos e de reações internas a eles como as
iniciações em novos modos de vida como formatura, casamento, aniversários,
entre outros. Algumas dessas experiências formativas são pessoais, outras são
compartilhadas com outras pessoas.
Turner (2005, p. 179) diz que “Dilthey via tais experiências como tendo
uma estrutura temporal ou processual – elas são ‘processadas’ através de
estágios distinguíveis” e interrompem o comportamento rotinizado e repetitivo.
Estas experiências iniciam-se com choques de dor ou prazer e invocam
precedentes e semelhanças de um passado consciente ou inconsciente e “as
emoções de experiências passadas dão cor às imagens e esboços revividos pelo
choque no presente”.
Logo em seguida, ocorre uma necessidade de encontrar significado naquilo
que se apresentou de maneira desconcertante, através da dor ou do prazer, e
coverteu a “mera experiência” em “uma
experiência”. Isto ocorre quando tentamos juntar passado e presente,
relacionando a preocupante experiência presente com resíduos de experiências
passadas, se não semelhantes, pelo menos relevantes. Quando isso ocorre “emerge
o tipo de estrutura relacional chamado ‘significado’”.
A experiência completa-se na expressão de uma forma performática e, dessa
maneira, Turner (1982) entende que o estudo das performances na busca dos significados
simbólicos é essencial na Antropologia da Experiência, exatamente porque a performance consuma a experiência.
Atualmente,
a aplicação teórico-metodológica da noção de performance é bem ampla, diversa e interdisciplinar. De acordo com Silva (2005), um eixo teórico
refere-se aos estudos de Victor Turner com o teatrólogo Richard Schechner que
entendem a performance como
manifestações de eventos rituais diferentes do cotidiano, configurando um tipo
“metateatro” da vida cotidiana, se a vida é encarada como a representação de um
teatro e papeis normativos. Em outras palavras, para esses autores, as performances:
[...]
constituem um espaço simbólico e de representação metafórica da realidade
social, através do jogo de inversão e desempenho de papéis figurativos que
sugerem criatividade e propiciam uma experiência
singular, que é, ao mesmo tempo, “reflexiva” e da “reflexividade” (SILVA, 2005,
p. 43).
Assim
sendo, de acordo com a perspectiva de Victor Turner, para se conhecer as
contradições da vida social, há a possibilidade de um “deslocamento do olhar”
para os elementos da vida social através das performances que interrompem o fluxo da vida cotidiana e propiciam
aos sujeitos a possibilidade de tomarem distância aos seus papéis normativos e,
através de lampejos, repensar a si mesmos, bem como a própria vida social e até
mesmo refazê-la. É a partir dessa noção que pensamos as experiências
performáticas na sala de aula no ensino de Sociologia que podem trazer novas
ideias e suscitarem novos significados.
Bibliografia
SILVA, Rubens Alves da.
Entre “artes” e “ciências”: A noção de performance
e drama no campo das ciências
sociais. Horizontes Antropológicos,
Porto Alegre, ano 11, nº 24, p. 35-65, 2005.
TURNER, Victor.
Introduction. In: TURNER,
Victor. From Ritual to Theatre: The
Human Seriousness of Play. New York: PAJ Publication. 1982.
_____________. Dewey,
Dilthey e Drama: um ensaio em Antropologia da Experiência (primeira parte). Cadernos de Campo – revista dos alunos de
pós-graduação em antropologia social da USP, nº 13, ano 14. São Paulo:
PPGAS/USP, 2005, p. 177-185.
Olá Fernando!
ResponderExcluirLendo o seu texto e tentando relacioná-lo ao que temos debatido em nossos encontros, podemos dizer que a linguagem impressa (passado?)quando se junta a linguagem audiovisual (presente)resultam numa "experiência" (que penso ser prazerosa e dolorosa ao mesmo tempo)que, através de estágios serão processadas? Se for assim, será que podemos realizar uma pesquisa com o objetivo de compreendermos em qual estágio nos encontramos e para quem ela é prazerosa ou dolorosa?
Oi!
ResponderExcluirSim, só que eu entendo que o "passado" não é apenas impresso mas tem diversas formas. E sobre a pesquisa acho que sim. Se entendi direito sua pergunta, o Turner explica que ao serem processadas, essas experiências passam por estágios distinguíveis entre si que envolvem desde uma ruptura com o cotidiano; uma "crise" (estou pensando na relação do ensino-professor/estudante), uma ação reparadora e um desfecho. O meu interesse é na "ação reparadora" dessa relação. Como uma representação metafórica age para reparar uma situação que possivelmente é conflituosa que é o processo de ensino. Contudo, como nós podemos abordar isso com os estudantes, pois a sensação do prazer à dor são para eles e para nós professores e futuros professores.
Bacana Fernando! Vamos ter um trabalho bem interessante. Abraço.
ResponderExcluir