quinta-feira, 21 de junho de 2012


A televisão e a experiência performática na sala de aula
Fernando Augusto Violin

A TV Pendrive, como ferramenta de ensino na sala de aula, permite o trabalho com o recurso de filmes, imagens, sons e movimentos. Durante a exposição de um filme, por exemplo, relacionado a um conteúdo sociológico, o processo de ensino cria uma performance  na sala de aula que intensifica as experiências sensoriais e sensitivas em que a imagem, o som e o movimento destacam-se numa experiência que possibilita o deslocamento das percepções, onde o significado possa ser produzido e percebido de maneira mais intensa.
O antropólogo Victor Turner (2005) captou a diferença em Dilthey que ele chama entre “mera experiência” e “uma experiência”. A “mera experiência” é a passiva resignação e aceitação dos eventos. “Uma experiência” é “como uma pedra num jardim de areia Zen, destaca-se da uniformidade da passagem das horas e dos anos e forma aquilo que Dilthey chamou de uma ‘estrutura da experiência’”. Ou seja, ela não tem um início ou um fim arbitrários, mas tem o que Dilthey chamou de “uma iniciação e uma consumação”, esclarece Turner (2005, p. 178-179).
Ele continua dizendo que todos nós já tivemos certas experiências ao longo da vida que foram “formativas” e “transformativas” envolvendo sequências distinguíveis de eventos externos e de reações internas a eles como as iniciações em novos modos de vida como formatura, casamento, aniversários, entre outros. Algumas dessas experiências formativas são pessoais, outras são compartilhadas com outras pessoas.
Turner (2005, p. 179) diz que “Dilthey via tais experiências como tendo uma estrutura temporal ou processual – elas são ‘processadas’ através de estágios distinguíveis” e interrompem o comportamento rotinizado e repetitivo. Estas experiências iniciam-se com choques de dor ou prazer e invocam precedentes e semelhanças de um passado consciente ou inconsciente e “as emoções de experiências passadas dão cor às imagens e esboços revividos pelo choque no presente”.
Logo em seguida, ocorre uma necessidade de encontrar significado naquilo que se apresentou de maneira desconcertante, através da dor ou do prazer, e coverteu a “mera experiência” em “uma experiência”. Isto ocorre quando tentamos juntar passado e presente, relacionando a preocupante experiência presente com resíduos de experiências passadas, se não semelhantes, pelo menos relevantes. Quando isso ocorre “emerge o tipo de estrutura relacional chamado ‘significado’”.
A experiência completa-se na expressão de uma forma performática e, dessa maneira, Turner (1982) entende que o estudo das performances na busca dos significados simbólicos é essencial na Antropologia da Experiência, exatamente porque a performance consuma a experiência.
Atualmente, a aplicação teórico-metodológica da noção de performance é bem ampla, diversa e interdisciplinar.  De acordo com Silva (2005), um eixo teórico refere-se aos estudos de Victor Turner com o teatrólogo Richard Schechner que entendem a performance como manifestações de eventos rituais diferentes do cotidiano, configurando um tipo “metateatro” da vida cotidiana, se a vida é encarada como a representação de um teatro e papeis normativos. Em outras palavras, para esses autores, as performances:

[...] constituem um espaço simbólico e de representação metafórica da realidade social, através do jogo de inversão e desempenho de papéis figurativos que sugerem criatividade e propiciam uma experiência singular, que é, ao mesmo tempo, “reflexiva” e da “reflexividade” (SILVA, 2005, p. 43).

Assim sendo, de acordo com a perspectiva de Victor Turner, para se conhecer as contradições da vida social, há a possibilidade de um “deslocamento do olhar” para os elementos da vida social através das performances que interrompem o fluxo da vida cotidiana e propiciam aos sujeitos a possibilidade de tomarem distância aos seus papéis normativos e, através de lampejos, repensar a si mesmos, bem como a própria vida social e até mesmo refazê-la. É a partir dessa noção que pensamos as experiências performáticas na sala de aula no ensino de Sociologia que podem trazer novas ideias e suscitarem novos significados.

Bibliografia

SILVA, Rubens Alves da. Entre “artes” e “ciências”: A noção de performance e drama no campo das ciências sociais. Horizontes Antropológicos, Porto Alegre, ano 11, nº 24, p. 35-65, 2005.
TURNER, Victor. Introduction. In: TURNER, Victor. From Ritual to Theatre: The Human Seriousness of Play. New York: PAJ Publication. 1982.
_____________. Dewey, Dilthey e Drama: um ensaio em Antropologia da Experiência (primeira parte). Cadernos de Campo – revista dos alunos de pós-graduação em antropologia social da USP, nº 13, ano 14. São Paulo: PPGAS/USP, 2005, p. 177-185.

3 comentários:

  1. Olá Fernando!
    Lendo o seu texto e tentando relacioná-lo ao que temos debatido em nossos encontros, podemos dizer que a linguagem impressa (passado?)quando se junta a linguagem audiovisual (presente)resultam numa "experiência" (que penso ser prazerosa e dolorosa ao mesmo tempo)que, através de estágios serão processadas? Se for assim, será que podemos realizar uma pesquisa com o objetivo de compreendermos em qual estágio nos encontramos e para quem ela é prazerosa ou dolorosa?

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  2. Oi!
    Sim, só que eu entendo que o "passado" não é apenas impresso mas tem diversas formas. E sobre a pesquisa acho que sim. Se entendi direito sua pergunta, o Turner explica que ao serem processadas, essas experiências passam por estágios distinguíveis entre si que envolvem desde uma ruptura com o cotidiano; uma "crise" (estou pensando na relação do ensino-professor/estudante), uma ação reparadora e um desfecho. O meu interesse é na "ação reparadora" dessa relação. Como uma representação metafórica age para reparar uma situação que possivelmente é conflituosa que é o processo de ensino. Contudo, como nós podemos abordar isso com os estudantes, pois a sensação do prazer à dor são para eles e para nós professores e futuros professores.

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  3. Bacana Fernando! Vamos ter um trabalho bem interessante. Abraço.

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